segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Almoço na Brasserie Rosário

Hoje almocei na Brasserie Rosário, no centro da cidade do Rio de Janeiro, a convite do mui simpático amigo Fernando, que mora em Uberlândia, no Estado de Minas Gerais. Já tinha passado por lá muitas vezes para comprar pão no balcão para levar para casa, mas ainda não havia entrado para fazer uma refeição. Ele deixou ao meu encargo a escolha do lugar, exigindo apenas que o serviço fosse à la carte e tivesse ar condicionado. Lembrei da brasserie e o levei para dar uma olhada no lugar. O serviço era à la carte, mas contrariando o seu pedido não havia ar condicionado. Olhamos da porta e resolvemos entrar assim mesmo. Num ato falho, apresentei o lugar como Brasserie Lipp, que fica em Paris, a centenas de milhas daqui, como diz Djavan na canção A Ilha. Fiquei um pouco sem graça quando me dei conta da minha troca. Fazer o quê? Sabe lá Deus porque eu estava com Paris na cabeça, o que, aliás, e convenhamos, não é uma má idéia!

A conversa fluiu com naturalidade, temperada com elegância sincera e leveza, que eu tanto prezo. Pena que o tempo passou muito rápido deixando no ar a sensação de que ainda tinhamos muito assunto pela frente. No retorno ao trabalho, levei comigo desse encontro a feliz constatação de que a vida realmente tem comigo uma generosa relação de delicadeza e adora me presentear quando eu estou distraída e menos espero.

sábado, 26 de dezembro de 2009

Um dia depois do Natal

Passada a festa natalina, abro o jornal para ler as notícias. Torço para que a justiça brasileira tenha acertado em relação ao pequeno Sean e que a sua vida volte à normalidade ao lado do pai. As opiniões se dividem, mas confesso que me causaram calafrios certos comentários que acompanhei em sites que noticiaram o caso. O que mais se lê em algumas opiniões é uma total inversão de valores, que infelizmente virou lugar-comum, mas que faz parte da complexidade humana. A verdade é que Sean tem um pai, que queria e tinha direito à guarda do filho, e que é sabido, foi separado do mesmo por uma decisão unilateral da mãe, que o trouxe de férias dos Estados Unidos para o Brasil comunicando por telefone que ambos não voltariam mais. Muito se disse aqui sobre David Goldman, acusado de aproveitador e de ser sustentado pela mãe de Sean enquanto casado com ela. À mim, nenhuma dessas acusações em relação a Goldman no decorrer do processo me causam espanto, haja vista que já testemunhei algumas tentativas de difamações praticadas por advogados para defenderem seus "protegidos". Honestamente, as lágrimas da avó materna também não me emocionaram. Seja como for, a justiça foi feita. Desejo do fundo do meu coração que Sean seja muito feliz!

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

A leitura é um vício impune

Cheguei ao final da leitura de Clarice na Cabeceira. Para quem gosta de contos e ainda mais de Clarice, é imperdível. Leitura para um fôlego só!
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Hoje, ganhei mais um livro de presente do amigo oculto do meu trabalho. Neste ano coloquei na minha lista de pedidos A Elegância do Ouriço, da francesa Muriel Barbery. Embora eu não tenha conversado com ninguém que já o tivesse lido, resolvi arriscar. A escolha ficou por conta das críticas e comentários super favoráveis que li em jornais e aqui na internet.

Eis a sinopse:

À primeira vista, não se nota grande movimento no número 7 da Rue de Grenelle: o endereço é chique, e os moradores são gente rica e tradicional. Para ingressar no prédio e poder conhecer seus personagens, com suas manias e segredos, será preciso infiltrar um agente ou uma agente ou — por que não? — duas agentes. É justamente o que faz Muriel Barbery em A elegância do ouriço, seu segundo romance.

Para começar, dando voz a Renée, que parece ser a zeladora por excelência: baixota, ranzinza e sempre pronta a bater a porta na cara de alguém. Na verdade, uma observadora refinada, ora terna, ora ácida, e um personagem complexo, que apaga as pegadas para que ninguém adivinhe o que guarda na toca: um amor extremado às letras e às artes, sem as nódoas de classe e de esnobismo que mancham o perfil dos seus muitos patrões.

E ainda há Paloma, a caçula da família Josse. O pai é um figurão da política, a mãe dondoca tem doutorado em letras, a irmã mais velha jura que é filósofa, mas Paloma conhece bem demais o verso e o reverso da vida familiar para engolir a história oficial. Tanto que se impõe um desafio terrível: ou descobre algum sentido para a vida, ou comete suicídio (seguido de incêndio) no seu aniversário de treze anos. Enquanto a data não chega, mantém duas séries de anotações pessoais e filosóficas: os Pensamentos profundos e o Diário do movimento do mundo, crônicas de suas experiências íntimas e também da vida no prédio. As vozes da garota e da zeladora, primeiro paralelas, depois entrelaçadas, vão desenhando uma espiral em que se misturam argumentos filosóficos, instantes de revelação estética, birras de classe e maldades adolescentes, poemas orientais e filmes blockbuster. As duas filósofas, Renée e Paloma, estão inteiramente entregues a esse ímpeto satírico e devastador, quando chega de mudança o bem-humorado Kakuro Ozu, senhor japonês com nome de cineasta que, sem alarde, saberá salvá-las tanto da mediocridade geral como dos próprios espinhos.
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A propósito: a frase que dá título a este post é de Valery Larbaud, retirada do livro Duailibi Essencial - Minidicionário com mais de 4500 frases essencias.

Fonte da sinopse: www.travessa.com.br

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Sapatinho de Cristal, Inverno e Clarice na Cabeceira

Hoje, ao chegar em casa, encontrei mais dois presentes na portaria do meu prédio. Um pelo meu aniversário no dia 10 deste mês, e o outro pelo natal que ainda está por vir. Neste ano, o meu aniversário foi recheado de surpresas maravilhosas, que me deixaram muito feliz. Telefonemas, presentes, abraços, beijos, brindes com caipivodkas e toda sorte de demonstração de afeto e consideração por parte dos amigos.

Há dois dias atrás recebi de Maceió, via sedex, "INVERNO e Outros Poemas", o primeiro livro, dentre outros, do querido amigo Ricardo Leal, acompanhado de uma linda e carinhosa dedicatória.
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Simplesmente estou amando tudo isso e muito agradecida. Já tinha até me esquecido como faz bem ao coração ser mimada por pessoas tão queridas.
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A todos, a minha sincera gratidão pelo carinho e pelo bem que fazem na minha vida!
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Aproveitando o post, deixo aqui como sugestão de um ótimo presente de natal, o livro "Clarice na Cabeceira", uma coletânea novinha em folha de contos da escritora, lançada pela Editora Rocco neste mês de dezembro.
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Sinopse
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Clarice na cabeceira, organizado pela doutora em Letras Teresa Montero, é uma bem escolhida amostra de instantes de beleza retirados das obras de Clarice Lispector e apontados por 22 integrantes da legião de fãs da escritora. E não se trata de quaisquer fãs. Luis Fernando Verissimo, Fernanda Torres, Affonso Romano de Sant’Anna, Rubem Fonseca, José Castello, Maria Bethânia e Luiz Fernando Carvalho são algumas das personalidades que compõem o time estelar de colaboradores do livro.

A seleção afetiva realizada por esses escritores, atrizes, cineastas, cantoras, jornalistas e críticos literários reúne textos de cada um dos livros de contos de Clarice: Laços de família (1960), A legião estrangeira (1964), Felicidade clandestina (1971), A via crucis do corpo (1974), Onde estivestes de noite (1974) e A bela e a fera (1979). Junto a cada um desses 22 contos que compõem Clarice na cabeceira, cada um dos leitores convidados compartilha a experiência de ter Clarice Lispector em suas vidas, seja por ter convivido com ela em algum momento, seja apenas por meio de seus livros. Em ambos os casos, a presença da escritora se faz marcante.

Luis Fernando Verissimo presenteia os leitores com recordações da amizade com Clarice. Iniciada primeiro através dos pais, Erico e Mafalda, na década de 50, quando todos viviam nos Estados Unidos, e continuada na década seguinte com a convivência de vizinhos no bairro do Leme, no Rio de Janeiro. A primeira impressão de Verissimo foi igual a de todo mundo: fascinação. Não só pela beleza eslava, pelos olhos meio asiáticos ou pelo erre carregado que dava a sua fala um mistério especial, mas também pelo humor e “aquele jeito de garotona ainda desacostumada com o tamanho do próprio corpo” .

Enquanto alguns descrevem o deslumbramento diante do poder de Clarice de criar textos ricos de significados a partir de passagens aparentemente comuns do cotidiano, outros preferem calar-se, como fez Fernanda Torres: “Tenho até vergonha de escrever. Qualquer comentário me parece obsoleto.” Há quem se veja diante de um mistério insolúvel ao lançar um olhar mais demorado sobre determinado texto, como faz Claire Williams, especialista em literatura luso-brasileira da Universidade de Oxford, com “O ovo e a galinha”: “É um conto em que se descobre algo novo em cada leitor, e em que se perde. Nunca o entendo, mas não é propriamente para entender.”

Clarice na cabeceira revela os contos favoritos da autora de A hora da estrela e outros clássicos de acordo com as preferências de 22 formadores de opinião, e deixa no ar, implicitamente, a mesma pergunta para cada leitor: qual o seu texto de cabeceira de Clarice Lispector?

domingo, 13 de dezembro de 2009

Fim de semana em Búzios

Neste sábado de manhã fui a trabalho para Cabo Frio e de lá parti para Búzios, onde passei o fim de semana. Desta vez, as fotos tiradas com a câmera do meu celular mostram Búzios coberta de nuvens, mas como sempre linda e calorosa . Foi um fim de semana tranquilo, sem a agitação de feriado.


Fiquei hospedada numa pousada super simpática na Praia de João Fernandes, situada na ponta nordeste da Península de Búzios, a 2 km do centro. À tarde relaxei na piscina e no começo da noite fui passear na Rua das Pedras. Comi crepe no Chez Michou, tomei sorvete, comprei um novo óculos escuros e um par de havainas dourada. Parei para conversar com amigos que encontrei por acaso, caminhei na Orla Bardot.

De volta à pousada, antes de dormir, sentei na varanda do meu quarto e abri um Prosecco para curtir a paisagem noturna. Um momento único de paz e merecimento. .

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Hoje, após o café da manhã, dei um mergulho na praia para lavar a alma e aproveitar as benesses vindas do mar.

Enfim, chegada a hora de arrumar a mala e partir, mas não sem antes almoçar cara a cara com a paisagem da Praia do Canto.


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"Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.

A tua beleza aumenta quando estamos sós.

E tão fundo intimamente a tua voz

Segue o mais secreto bailar do meu sonho

Que momentos há em que eu suponho

Seres um milagre criado só para mim"

Sophia de Mello Breyner Andresen

domingo, 29 de novembro de 2009

Entre a "dor" e o "nada", o que você prefere?


Não quero defender as relações falidas e que só fazem mal, nem estou sugerindo que as pessoas insistam em sentimentos que não são correspondidos, em relacionamentos que não são recíprocos, mas quero reafirmar a minha crença sobre o quanto considero válida a coragem de recomeçar, ainda que seja a mesma relação; a coragem de continuar acreditando, sobretudo porque a dor faz parte do amor, da vida, de qualquer processo de crescimento e evolução.
Pelas queixas que tenho ouvido, pelas atitudes que tenho visto, pela quantidade de pessoas depressivas que perambulam ocas pelo mundo, parece que temos escolhido muito mais vezes o “nada” do que a “dor”.

Quando você se perguntar “do que adianta amar, tentar, entregar-se, dar o melhor de mim, se depois vem a dor da separação, do abandono, da ingratidão?”, pense nisso: então você prefere a segurança fria e vazia das relações rasas? Então você prefere a vida sem intensidade, os passos sem a busca, os dias sem um desejo de amor? Você prefere o nada, simplesmente para não doer?
Não quero dizer que a dor seja fácil, mas pelo amor de Deus, que me venha a dor impagável do aprendizado que é viver. Que me venha a dor inevitável à qual as tentativas nos remetem. Que me venha logo, sempre e intensa, a dor do amor...

Prefiro o escuro da noite a nunca ter me extasiado com o brilho da Lua...
Prefiro o frio da chuva a nunca ter sentido o cheiro de terra molhada...
Prefiro o recolhimento cinza e solitário do inverno a nunca ter me sentido inebriada pela magia acolhedora do outono, encantada pela alegria colorida da primavera e seduzida pelo calor provocante do verão...

E nesta exata medida, prefiro a tristeza da partida a nunca ter me esparramado num abraço...
Prefiro o amargo sabor do “não” a nunca ter tido coragem de sair da dúvida...
Prefiro o eco ensurdecedor da saudade a nunca ter provado o impacto de um beijo forte e apaixonado... daqueles que recolocam todos os nossos hormônios no lugar!

Prefiro a angústia do erro a nunca ter arriscado...
Prefiro a decepção da ingratidão a nunca ter aberto meu coração...
Prefiro o medo de não ter meu amor correspondido a nunca ter amado ensandecidamente.

Prefiro a certeza desesperadora da morte a nunca ter tido a audácia de viver com toda a minha alma, com todo o meu coração, com tudo o que me for possível...
Enfim, prefiro a dor, mil vezes a dor, do que o nada...

Não há – de fato – algo mais terrível e verdadeiramente doloroso do que a negação de todas as possibilidades que antecedem o “nada”.

E já que a dor é o preço que se paga pela chance espetacular de existir, desejo que você ouse, que você pare de se defender o tempo todo e ame, dê o seu melhor, faça tudo o que estiver ao seu alcance, e quando achar que não dá mais, que não pode mais, respire fundo e comece tudo outra vez...

Porque você pode desistir de um caminho que não seja bom, mas nunca de caminhar...
Pode desistir de uma maneira equivocada de agir, mas nunca de ser você mesmo...
Pode desistir de um jeito falido de se relacionar, mas nunca de abrir seu coração...

Portanto, que venha o silêncio visceral que deixa cicatrizes em meu peito depois das desilusões e dos desencontros... Mas que eu nunca, jamais deixe de acreditar que daqui a pouco, depois de refeita e ainda mais predisposta a acertar, vou viver de novo, vou doer de novo e sobretudo, vou amar mais uma vez... e não somente uma pessoa, mas tudo o que for digno de ser amado!



Fonte: artigo de Rosana Braga (http://www.rosanabraga.com.br)

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

MARIO QUINTANA – CARTA A UM POETA

Meu caro poeta,

Por um lado foi bom que me tivesses pedido resposta urgente, senão eu jamais escreveria sobre o assunto desta, pois não possuo o dom discursivo e expositivo, vindo daí a dificuldade que sempre tive de escrever em prosa. A prosa não tem margens, nunca se sabe quando, como e onde parar. O poema, não; descreve uma parábola traçada pelo próprio impulso (ritmo); é que nem um grito. Todo poema é, para mim, uma interjeição ampliada; algo de instintivo, carregado de emoção. Com isso não quero dizer que o poema seja uma descarga emotiva, como o fariam os românticos. Deve, sim, trazer uma carga emocional, uma espécie de radioatividade, cuja duração só o tempo dirá. Por isso há versos de Camões que nos abalam tanto até hoje e há versos de hoje que os pósteros lerão com aquela cara com que lemos os de Filinto Elísio. Aliás, a posteridade é muito comprida: me dá sono. Escrever com o olho na posteridade é tão absurdo como escreveres para os súditos de Ramsés II, ou para o próprio Ramsés, se fores palaciano. Quanto a escrever para os contemporâneos, está muito bem, mas como é que vais saber quem são os teus contemporâneos? A única contemporaneidade que existe é a da contingência política e social, porque estamos mergulhados nela, mas isto compete melhor aos discursivos e expositivos, aos oradores e catedráticos. Que sobra então para a poesia? – perguntarás. E eu te respondo que sobras tu. Achas pouco? Não me refiro à tua pessoa, refiro-me ao teu eu, que transcende os teus limites pessoais, mergulhando no humano. O Profeta diz a todos: “eu vos trago a verdade”, enquanto o poeta, mais humildemente, se limita a dizer a cada um: “eu te trago a minha verdade.” E o poeta, quanto mais individual, mais universal, pois cada homem, qualquer que seja o condicionamento do meio e e da época, só vem a compreender e amar o que é essencialmente humano. Embora, eu que o diga, seja tão difícil ser assim autêntico. Às vezes assalta-me o terror de que todos os meus poemas sejam apócrifos!

Meu poeta, se estas linhas estão te aborrecendo é porque és poeta mesmo. Modéstia à parte, as digressões sobre poesia sempre me causaram tédio e perplexidade. A culpa é tua, que me pediste conselho e me colocas na insustentável situação em que me vejo quando essas meninas dos colégios vêm (por inocência ou maldade dos professores) fazer pesquisas com perguntas assim: “O que é poesia? Por que se tornou poeta? Como escreve os seus poemas?” A poesia é dessas coisas que a gente faz, mas não diz.

A poesia é um fato consumado, não se discute; perguntas-me, no entanto, que orientação de trabalho seguir e que poetas deves ler. Eu tinha vontade de ser um grande poeta para te dizer como é que eles fazem. Só te posso dizer o que eu faço. Não sei como vem um poema. Às vezes uma palavra, uma frase ouvida, uma repentina imagem que me ocorre em qualquer parte, nas ocasiões mais insólitas. A esta imagem respondem outras. Por vezes uma rima até ajuda, com o inesperado da sua associação. (Em vez de associações de idéias, associações de imagem; creio ter sido esta a verdadeira conquista da poesia moderna.) Não lhes oponho trancas nem barreiras. Vai tudo para o papel. Guardo o papel, até que um dia o releio, já esquecido de tudo (a falta de memória é uma bênção nestes casos). Vem logo o trabalho de corte, pois noto logo o que estava demais ou o que era falso. Coisas que pareciam tão bonitinhas, mas que eram puro enfeite, coisas que eram puro desenvolvimento lógico (um poema não é um teorema) tudo isso eu deito abaixo, até ficar o essencial, isto é, o poema. Um poema tanto mais belo é quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.

Como vês, para isso é preciso uma luta constante. A minha está durando a vida inteira. O desfecho é sempre incerto. Sinto-me capaz de fazer um poema tão bom ou tão ruinzinho como aos 17 anos. Há na Bíblia uma passagem que não sei que sentido lhe darão os teólogos; é quando Jacob entra em luta com um anjo e lhe diz: “Eu não te largarei até que me abençoes”. Pois bem, haverá coisa melhor para indicar a luta do poeta com o poema? Não me perguntes, porém, a técnica dessa luta sagrada ou sacrílega. Cada poeta tem de descobrir, lutando, os seus próprios recursos. Só te digo que deves desconfiar dos truques da moda, que, quando muito, podem enganar o público e trazer-te uma efêmera popularidade.

Em todo caso, bem sabes que existe a métrica. Eu tive a vantagem de nascer numa época em que só se podia poetar dentro dos moldes clássicos. Era preciso ajustar as palavras naqueles moldes, obedecer àquelas rimas. Uma bela ginástica, meu poeta, que muitos de hoje acham ingenuamente desnecessária. Mas, da mesma forma que a gente primeiro aprendia nos cadernos de caligrafia para depois, com o tempo, adquirir uma letra própria, espelho grafológico da sua individualidade, eu na verdade te digo que só tem capacidade e moral para criar um ritmo livre quem for capaz de escrever um soneto clássico. Verás com o tempo que cada poema, aliás, impõe sua forma; uns, as canções, já vêm dançando, com as rimas de mãos dadas, outros, os dionisíacos (ou histriônicos, como queiras) até parecem aqualoucos. E um conselho, afinal: não cortes demais (um poema não é um esquema); eu próprio que tanto te recomendei a contenção, às vezes me distendo, me largo num poema que vai lá seguindo com os detritos, como um rio de enchente, e que me faz bem, porque o espreguiçamento é também uma ginástica. Desculpa se tudo isso é uma coisa óbvia; mas para muitos, que tu conheces, ainda não é; mostra-lhes, pois, estas linhas.

Agora, que poetas deves ler? Simplesmente os poetas de que gostares e eles assim te ajudarão a compreender-te, em vez de tu a eles. São os únicos que te convêm, pois cada um só gosta de quem se parece consigo. Já escrevi, e repito: o que chamam de influência poética é apenas confluência. Já li poetas de renome universal e, mais grave ainda, de renome nacional, e que, no entanto, me deixaram indiferente. De quem a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família.

Enfim, meu poeta, trabalhe, trabalhe em seus versos e em você mesmo e apareça-me daqui a vinte anos. Combinado?

Mario Quintana


domingo, 22 de novembro de 2009

Feriado na Serra

Passei um feriado tranquilo na serra, apesar do calor. A temperatura já não é mais a mesma de tempos atrás, o que é uma pena. Hoje, diferentemente de épocas passadas, faz calor durante o dia e não refresca tanto durante a noite. Dorme-se apenas com um lençol alternando entre cobrir-se e descobrir-se durante a madrugada, mas ainda assim a temperatura serrana é um pouco mais amena do que na cidade do Rio de Janeiro.

No sábado apareceu no portão da casa uma viralata visivelmente faminta e necessitada de cuidados. Demos a ela comida e água, e no domingo de manhã fui pessoalmente levar ração para a coitada. A bichinha me olhou com olhos fundos e carentes. Ficou resolvido que enquanto permanecer ali, lhe será oferecido água e comida, até que alguém se apiede dela e resolva levá-la para casa.

À noite, de volta ao Rio e no conforto do meu quarto, lembrei do jeito que a viralata olhou para mim. E pensar que muitas vezes evitamos olhar nos olhos de um menino de rua por não termos coragem de encarar a triste realidade do abandono. Talvez porque ao nos defrontrarmos com um olhar vazio e pedinte, seja quase inevitável não nos defrontamos com as nossas próprias carências e misérias interiores.

Torço para que a cadelinha abandonada não arrede pé do portão da casa até o fim da semana que vem, porque com certeza se permanecer por lá, acabará sendo convidada para entrar. E assim ela vai ficando, ficando, ficando...

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

A ARTE DO PAPEL DOBRADO

Simon Schubert, artista alemão, dobra e vinca papel para criar incríveis trabalhos de arte. Clique aqui e confira.
Fonte: site Inusitatus

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

MODA E ATITUDE

Os sites, as revistas e os desfiles de moda estão aí anunciando em alto e bom tom o comprimento das roupas que serão o hit da próxima estação.

No Rio, a atriz Antonia Fontenelle, namorada do diretor da TV Globo, Marcos Paulo, já deu o seu parecer sobre a tendência da nova estação, chegando nesta quarta-feira no Copacabana Palace, para o lançamento de sua coleção de joias, num mini e decotado vestido preto - uma coisa meio Uniban - disse.

A coleção de verão-2010 vem com toda a força para dar um "cala boca" em qualquer ameaça de retrocesso, porque moda também é atitude. Cliquem no link e confiram.





Fico por aqui e não se fala mais nisso!



Fontes: Moda com estilo

ego.globo.com

E O APAGÃO, HEIN?

Já ouvi milhares de especulações, inclusive que teria sido obra de hackers. A última notícia que li foi essa: Será que será?

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Uniban, sob pressão, recua

Confesso que ao ler agora de manhã que a Uniban, sob pressão, recuou da decisão de expulsar a aluna da universidade, me fez sentir o doce gosto da reparação após uma injustiça cometida.

Conforme escreveu hoje o jornalista Merval Pereira na sua coluna do jornal O Globo, "a repercussão negativa daquela atitude bárbara de uma turba de estudantes universitários, gritando "estupra" e xingando a colega, tomou conta dos sites de relacionamento e dos blogs, colocando de um lado aquela reação de vândalos representando o lado atrasado e preconceituoso da nossa sociedade, em contraponto ao país moderno que deveria estar sendo criado e incentivado também dentro das universidades."

"O recuo da Universidade Bandeirantes (Uniban), de São Bernardo do Campo, da decisão de expulsar a estudante de turismo Geysi Arruda é o resultado da reação da parte saudável e moderna da nossa sociedade, que já não admite com tanta naturalidade quanto a direção da universidade imaginou que agressões desse tipo sejam realizadas."

"A aluna Geysi Arruda deu entrevistas dizendo que a sua primeira reação foi a de se sentir culpada por tudo o que aconteceu, se sentir "um lixo". É a reação natural de toda pessoa que se transforma, por pressões sociais hipócritas, de vítima em culpada."

"Esses modernos meios de comunicação, como a internet ou o twitter, por serem quase incontroláveis por sua própria natureza, são o tormento tanto de governos quanto de sociedades autoritárias."

É isso aí, minha gente, abaixo a hipocrisia tropical!

domingo, 8 de novembro de 2009

Alguma coisa está fora da ordem

Não posso deixar de registrar aqui a minha indignação ao ler no jornal, hoje de manhã, sobre a expulsão da estudante da Universidade Bandeirante (UNIBAN), "em razão do flagrante desrespeito aos princípios éticos, à dignidade acadêmica e a moralidade". A estudante passou de vítima a ré.

"ALGUMA COISA ESTÁ FORA DA ORDEM
FORA DA NOVA ORDEM MUNDIAL"

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Feriado em Tiradentes

Cheguei hoje de Tiradentes, onde fui descansar neste fim de semana prolongado. Foram quatro dias de sol, ótima comida mineira e noites de lua cheia. Levei o livro da Paula Dip, Para Sempre teu, Caio F., que terminei de ler durante a viagem. A cidade estava lotada de turistas, o que me fez optar por ficar mais em casa e mergulhar na leitura. Amanhã volto ao batente, mas confesso que desta vez tive vontade de esticar a minha estada por mais alguns dias, longe da vida acelerada do Rio de Janeiro.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

EM DEFESA DO ROMANCE - Mario Vargas Llosa

Por indicação do Claudio, autor do Blog Do Lido ao Vivido, li na revista piauí a matéria intitulada Em Defesa do Romance, do escritor Mario Vargas Llosa. Pela importância do artigo, achei por bem compartilhá-lo aqui. Transcrevo-o na íntegra, desejando que se fartem e se deliciem tanto quanto eu com a belíssima e emocionante defesa de Llosa da literatura.


Incivilizado, bárbaro, órfão de sensibilidade e pobre de palavra, ignorante e grave, alheio à paixão e ao erotismo - um mundo sem literatura teria como traço principal o conformismo, a submissão dos seres humanos ao estabelecido. Seria um mundo animal


Muitas vezes me ocorre, nas feiras de livros ou nas livrarias, que um senhor se aproxime de mim com um livro meu nas mãos e me peça para autografá-lo, especificando: é para a minha mulher, ou minha filha, ou minha irmã, ou minha mãe; ela, ou elas, são grandes leitoras e são apaixonadas por literatura. E eu lhe pergunto, de imediato: "E o senhor? Não gosta de ler?"

A resposta chega pontual, quase sempre: "Bem, sim, é claro que gosto, mas sou uma pessoa muito ocupada, sabe como é." Sim, sei muito bem, porque ouvi essa explicação dezenas de vezes: esse senhor, esses milhares de senhores iguais a ele têm tantas coisas importantes, tantas obrigações e responsabilidades na vida, que não podem desperdiçar seu tempo precioso passando horas e horas imersos num romance, num livro de poemas ou num ensaio literário. Segundo essa concepção, a literatura é uma atividade da qual se pode prescindir, um entretenimento elevado e útil para cultivar a sensibilidade e as boas maneiras, um ornamento que se podem permitir os que dispõem de tempo livre para a recreação, e que seria necessário computar na categoria dos esportes, do cinema, do bridge ou do xadrez, mas que pode ser sacrificado sem escrúpulos no momento de estabelecer uma escala de prioridades nos afazeres e compromissos indispensáveis da luta pela vida.

É verdade que a literatura acabou por se tornar, cada vez mais, uma atividade feminina: nas livrarias, nas conferências ou nas readings dos escritores e, naturalmente, nos departamentos e nas faculdades em que se estuda literatura, as saias ganham de goleada das calças. A explicação é que, na classe média, as mulheres leem mais porque trabalham menos horas que os homens, e que muitas delas tendem a se considerar mais justificadas do que os homens no tempo que dedicam à fantasia e à ilusão. Como sou um tanto alérgico a essas explicações, que dividem homens e mulheres em categorias estanques com virtudes e fraquezas coletivas, não partilho dessas interpretações; mas num aspecto não resta dúvida: há cada vez menos leitores de literatura - há muitos leitores, mas de lixo impresso - e, entre eles, as mulheres prevalecem.

Uma pesquisa organizada recentemente pela Sociedade Geral de Autores Espanhóis forneceu um dado alarmante: metade dos habitantes daquele país jamais leu um livro. A pesquisa revelou também que, na minoria leitora, o número de mulheres que declaram ler é superior em 6,2% ao dos homens. Muito me alegro pelas mulheres, é claro, mas me preocupo pelos homens, e pelos milhões de seres humanos que, podendo ler, renunciaram a fazer isso. Não só porque desconhecem o prazer que perdem, mas porque estou convencido de que uma sociedade sem romances, ou na qual a literatura foi relegada, como certos vícios inconfessáveis, às margens da vida social e convertida mais ou menos num culto sectário, essa sociedade está condenada a se barbarizar no plano espiritual e a pôr em risco a própria liberdade.

Vivemos numa época de especialização do conhecimento, causada pelo prodigioso desenvolvimento da ciência e da técnica, e da sua fragmentação em inumeráveis afluentes e compartimentos estanques. A especialização permite aprofundar a exploração e a experimentação, e é o motor do progresso; mas determina também, como consequência negativa, a eliminação daqueles denominadores comuns da cultura graças aos quais os homens e as mulheres podem coexistir, comunicar-se e se sentir de algum modo solidários.

A especialização leva à incomunicabilidade social, à fragmentação do conjunto de seres humanos em guetos culturais de técnicos e especialistas, aos quais a linguagem, alguns códigos e a informação progressivamente setorizada relegam naquele particularismo contra o qual nos alertava o antiquíssimo adágio: não é necessário se concentrar tanto no ramo nem na folha, a ponto de esquecer que eles fazem parte de uma árvore, e esta de um bosque. O sentido de pertencimento, que conserva unido o corpo social e o impede de se desintegrar em uma miríade de particularismos solipsistas, depende, em boa medida, de que se tenha uma consciência precisa da existência do bosque. E o solipsismo - de povos ou indivíduos - gera paranoias e delírios, as deformações da realidade que sempre dão origem ao ódio, às guerras e aos genocídios. A ciência e a técnica não podem mais cumprir aquela função cultural integradora em nosso tempo, preci-samente pela infinita riqueza de conhecimentos e da rapidez de sua evolução que levou à especialização e ao uso de vocabulários herméticos.

A literatura, ao contrário, diferentemente da ciência e da técnica, é, foi e continuará sendo, enquanto existir, um desses denominadores comuns da experiência humana, graças ao qual os seres vivos se reconhecem e dialogam, independentemente de quão distintas sejam suas ocupações e seus desígnios vitais, as geografias, as circunstâncias em que se encontram e as conjunturas históricas que lhes determinam o horizonte. Nós, leitores de Cervantes ou de Shakespeare, de Dante ou de Tolstoi, nos sentimos membros da mesma espécie porque, nas obras que eles criaram, aprendemos aquilo que partilhamos como seres humanos, o que permanece em todos nós além do amplo leque de diferenças que nos separam. E nada defende melhor os seres vivos contra a estupidez dos preconceitos, do racismo, da xenofobia, das obtusidades localistas do sectarismo religioso ou político, ou dos nacionalismos discriminatórios, do que a comprovação constante que sempre aparece na grande literatura: a igualdade essencial de homens e mulheres em todas as latitudes, e a injustiça representada pelo estabelecimento entre eles de formas de discriminação, sujeição ou exploração.

Nada, mais que bons romances, ensina a ver nas diferenças étnicas e culturais a riqueza do patrimônio humano, e a valorizá-las como uma manifestação de sua múltipla criatividade. Ler boa literatura é divertir-se, com certeza; mas também aprender, dessa maneira direta e intensa que é a da experiência vivida através das obras de ficção, o que somos e como somos em nossa integridade humana, com os nossos atos, os nossos sonhos e os nossos fantasmas, a sós e na urdidura das relações que nos ligam aos outros, em nossa presença pública e no segredo de nossa consciência, essa soma extremamente complexa de verdades contraditórias - como as chamava Isaiah Berlin - de que é feita a condição humana.

Esse conhecimento totalizador e imediato do ser humano, hoje, se encontra apenas no romance. Nem mesmo os outros ramos das disciplinas humanistas - como a filosofia, a psicologia, a história ou as artes - puderam preservar essa visão integradora e um discurso acessível porque, por trás da pressão irresistível da cancerosa divisão e fragmentação do conhecimento, acabaram por sucumbir também às imposições da especialização, por isolar-se em territórios cada vez mais segmentados e técnicos, cujas ideias e linguagens estão fora do alcance da mulher e do homem comuns. Não é nem pode ser o caso da literatura, embora alguns críticos e teóricos se empenhem em transformá-la em uma ciência, porque a ficção não existe para investigar uma área determinada da experiência, mas para enriquecer de maneira imaginária a vida, a de todos, a vida que não pode ser desmembrada, desarticulada, reduzida a esquemas ou fórmulas, sem que desapareça.

Por isso, Marcel Proust disse: "A verdadeira vida, a vida por fim esclarecida e descoberta, a única vida, pois, plenamente vivida, é a literatura." Não exagerava, guiado pelo amor a essa vocação que praticou com talento superlativo: simplesmente queria dizer que, graças à literatura, a vida se compreende e se vive melhor, e entendê-la e vivê-la melhor significa vivê-la e partilhá-la com os outros.

Borges se irritava quando lhe perguntavam: "Para que serve a literatura?" Parecia-lhe uma pergunta idiota, e ele respondia: "A ninguém ocorreria perguntar-se sobre qual é a utilidade do canto de um canário ou das cores do céu no crepúsculo!"; com efeito, se essas coisas belas estão ali e graças a elas a vida, ainda que por um instante, é menos feia e menos triste, não é mesquinho procurar justificativas práticas?

À diferença do gorjeio dos pássaros ou do espetáculo do sol fundindo-se no horizonte, um poema, um romance não estão pura e simplesmente ali, fabricados por acaso ou pela natureza. São uma criação humana, e é lícito perguntar como e por que nasceram, e o que deram à humanidade para que a literatura, cujas origens remotas se confundem com as da escrita, tenha durado tanto tempo. Nasceram como fantasmas incertos, no íntimo de uma consciência, projetados a ela pelas forças conjugadas do inconsciente, de uma sensibilidade e de algumas emoções, a que, numa luta às vezes implacável com as palavras, o poeta, o narrador, deram forma, corpo, movimento, ritmo, harmonia, vida. Uma vida artificial, feita com a linguagem e a fantasia, que coexiste com a outra, a real, desde tempos imemoriais, e à qual acorrem homens e mulheres porque a vida que têm não lhes basta, não é capaz de oferecer tudo aquilo que gostariam de ter. O romance não começa a existir quando nasce, por obra de um indivíduo; só existe realmente quando é adotado pelos outros e passa a fazer parte da vida social, quando se torna, graças à leitura, experiência partilhada.

Um dos primeiros efeitos benéficos se verifica no plano da linguagem. Uma comunidade sem literatura escrita se exprime com menos precisão, riqueza de nuances e clareza do que outra cujo instrumento principal de comunicação, a palavra, foi cultivado e aperfeiçoado graças aos textos literários. Uma humanidade sem romances, não contaminada pela literatura, se pareceria com uma comunidade de tartamudos e afásicos, atormentada por problemas terríveis de comunicação causados por uma linguagem ordinária e rudimentar.

Isso vale também para os indivíduos, obviamente. Uma pessoa que não lê, ou que lê pouco, ou que lê apenas porcarias, pode falar muito, mas dirá sempre poucas coisas, porque para se exprimir dispõe de um repertório reduzido e inadequado de vocábulos. Não se trata apenas de um limite verbal; é, a um só tempo, um limite intelectual e de horizonte imaginário, uma indigência de pensamentos e de conhecimentos, porque as ideias, os conceitos, mediante os quais nos apropriamos da realidade e dos segredos da nossa condição, não existem dissociados das palavras, por meio das quais as reconhece e define a consciência. Aprende-se a falar com precisão, com profundidade, com rigor e agudeza, graças à boa literatura, e apenas graças a ela.

Nenhuma outra disciplina, nenhum outro ramo das artes, pode substituir a literatura na formação da linguagem com que as pessoas se comunicam. Os conhecimentos que nos transmitem os manuais científicos e os tratados técnicos são fundamentais; mas eles não nos ensinam a dominar as palavras nem a exprimi-las com propriedade: pelo contrário, amiúde são mal escritos e revelam certa confusão linguística porque os autores, às vezes eminências indiscutíveis em sua profissão, são literariamente incultos e não sabem se servir da linguagem para comunicar os tesouros conceituais de que são detentores. Falar bem, dispor de uma linguagem rica e variada, encontrar a expressão adequada para cada ideia ou emoção que se queira comunicar, significa estar mais preparado para pensar, ensinar, aprender, dialogar e, também, para fantasiar, sonhar, sentir e emocionar-se.

De uma maneira sub-reptícia, as palavras reverberam em todas as ações da vida, até mesmo nas que parecem muito distantes da linguagem. Isso, na medida em que, graças à literatura, evoluiu até níveis elevados de refinamento e de sutileza nas nuances, elevou as possibilidades da fruição humana, e, com relação ao amor, sublimou os desejos e alçou à categoria de criação artística o ato sexual. Sem a literatura não existiria o erotismo. O amor e o prazer seriam mais pobres, privados de delicadeza e de distinção, da intensidade a que chegam todos aqueles que se educaram e estimularam com a sensibilidade e as fantasias literárias. Não é exagero afirmar que um casal que haja lido Garcilaso, Petrarca, Góngora e Baudelaire ama e usufrui mais do que outro, de analfabetos semi-idiotizados pelas séries de televisão. Em um mundo iletrado, o amor e a fruição não poderiam ser diferenciados daqueles que satisfazem os animais, não iriam além da mera satisfação dos instintos elementares: copular e devorar.

Os meios audiovisuais não estão em condições de substituir a literatura na função de ensinar o ser humano a usar com segurança, e talento, as riquíssimas possibilidades que a língua encerra. Esses meios tendem a relegar as palavras a um segundo plano em relação às imagens, que são a sua linguagem essencial, e a reduzir a língua à sua expressão oral, ao mínimo indispensável, o mais distante possível de sua vertente escrita que, na tela e nos alto-falantes, resulta sempre soporífera. Dizer de um filme ou de um programa que ele é "literário" é um modo educado de chamá-lo de chato.

Isso me leva a pensar, também, embora sobre essa questão eu deva admitir que nutro certas dúvidas, que não só a literatura é indispensável para o conhecimento correto e para o domínio da língua, mas que o destino dos romances está ligado, em um matrimônio indissolúvel, ao do livro, produto industrial que muitos declaram já obsoleto.

Um deles é um senhor importante e a quem a humanidade deve muito no campo das comunicações, isto é, Bill Gates, o fundador da Microsoft. O senhor Gates estava em Madri, há pouco tempo, e visitou a Real Academia Espanhola, com a qual a Microsoft lançou as bases daquilo que, assim se espera, será uma fecunda colaboração. Entre outras coisas, Bill Gates assegurou aos acadêmicos que se ocupará pessoalmente de que a letra "ñ" nunca seja retirada dos computadores, promessa que, é óbvio, arrancou de nós um suspiro de alívio, de nós, 400 milhões de hispanohablantes dos cinco continentes, para os quais a mutilação daquela letra essencial no ciberespaço teria criado problemas babélicos.

Pois bem, imediatamente depois dessa concessão amável à língua espanhola e, assim entendo, sem ter sequer deixado a Real Academia, Bill Gates declarou que espera não morrer sem ter realizado o seu maior projeto. E qual seria ele? Acabar com o papel, e, pois, com os livros, mercadoria que, a seu entender, já é de um anacronismo contumaz. O senhor Gates explicou que as telas dos computadores estão em condições de substituir com êxito o papel em todas as funções e que, além de isso custar menos, de ocupar menos espaço e de ser mais fácil de transportar, as informações e a literatura por meio da tela terão a vantagem ecológica de pôr fim à devasta-ção dos bosques, cataclismo que, pelo visto, é consequência da indústria de papel. As pessoas continuam a ler, explicou ele, mas nas telas, e, desse modo, haverá mais clorofila no meio ambiente.

Eu não estava presente - tomei conhecimento desses detalhes pela imprensa -, mas, se houvesse estado lá, teria interrompido rumorosamente o senhor Bill Gates para contestar, sem o menor constrangimento, a sua intenção de nos aposentar a mim e a tantos colegas meus, a nós, pobres escritores de livros. Pode o monitor substituir o livro em todos os casos, como afirma o criador da Microsoft? Não estou seguro disso. Digo isso sem negar, de modo algum, a revolução que no campo das comunicações e da informação representou o desenvolvimento das novas técnicas, como a internet, que todo dia me presta uma ajuda inestimável em meu trabalho; mas daí a admitir que a tela eletrônica possa substituir o papel no que concerne às leituras literárias há uma lacuna que não consigo preencher. Simplesmente não sou capaz de aceitar a ideia de que a leitura não funcional nem prática, a que não busca uma informação nem uma comunicação de utilidade imediata, possa conviver na tela de um computador com o sonho e com a fruição da palavra, gerando a mesma sensação de intimidade, a mesma concentração e o mesmo isolamento espiritual do livro.

Talvez seja um preconceito, resultante da falta de prática, da já longa identificação na minha experiência da literatura com os livros de papel, mas, se bem que navegue com muito prazer na internet em busca de notícias do mundo, não me ocorreria servir-me dela para ler os poemas de Góngora, um romance de Onetti ou de Calvino, nem um ensaio de Octavio Paz, porque sei muito bem que o efeito dessa leitura jamais seria o mesmo.

A literatura não diz nada aos seres humanos satisfeitos com seu destino, de todo contentes com o modo como vivem a vida. A literatura é alimento dos espíritos indóceis e propagadora da inconformidade, um refúgio para quem tem muito ou muito pouco na vida, onde é possível não ser infeliz, não se sentir incompleto, não ser frustrado nas próprias aspirações. Cavalgar junto ao esquálido Rocinante e a seu desregrado cavaleiro pelas terras da Mancha, percorrer os mares em busca da baleia branca com o capitão Ahab, tomar o arsênico com Emma Bovary ou transformar-se em inseto com Gregor Samsa é um modo astuto que inventamos para nos mitigar pelas ofensas e imposições desta vida injusta que nos obriga a sermos sempre os mesmos, enquanto gostaríamos de ser muitos, tantos quantos fossem necessários para satisfazer os desejos incandescentes de que somos possuídos.

Só momentaneamente é que o romance aplaca essa insatisfação vital, mas, nesse intervalo milagroso, nessa suspensão temporária da vida em que a ilusão literária nos imerge - que parece nos arrancar da cronologia e da história e nos converter em cidadãos de uma pátria sem tempo, imortal - somos outros. Mais intensos, mais ricos, mais complexos, mais felizes, mais lúcidos do que na rotina forçada da nossa vida real. Quando, fechado o livro, posta de parte a ficção, voltamos àquela e a comparamos com o território resplandecente que mal acabamos de deixar, espera-nos uma grande desilusão. Isto é, esta grande confirmação: que a vida sonhada do romance é melhor - mais bela e variada, mais compreensível e perfeita - do que a que vivemos quando estamos despertos, uma vida tolhida nos limites e na servidão a nossa condição.

Nesse sentido, a boa literatura é sempre - ainda que não proponha isso nem se dê conta disso - sediciosa, insubmissa, em revolta: um desafio ao que existe. A literatura nos permite viver em um mundo cujas leis transgridem as leis inflexíveis em meio às quais transcorre a nossa vida real, emancipados da prisão do espaço e do tempo, na impunidade para o excesso e donos de uma soberania que não conhece limites. Como não nos sentirmos defraudados depois de termos lido Guerra e Paz ou Em Busca do Tempo Perdido, ao nos voltarmos a este mundo de mesquinharias infinitas, de fronteiras e proibições que estão à espreita e que em toda parte, a cada passo, perturbam nossas ilusões? Esta é, talvez, ainda mais do que conservar a continuidade da cultura e enriquecer a linguagem, a melhor contribuição da literatura ao progresso humano: recordar-nos (involuntariamente, na maior parte dos casos) de que o mundo se acha mal-acabado, de que mentem os que sustentam o contrário - por exemplo, os poderes que o governam -, e de que poderia ser melhor, mais próximo dos mundos que a nossa imaginação e a nossa palavra são capazes de inventar.

Entenda-se bem: chamar de sediciosa uma literatura porque as belas obras de ficção desenvolvem nos leitores uma consciência alerta em face das imperfeições do mundo real não significa, como creem as igrejas e os governos que se fiam da censura para atenuar ou anular sua carga subversiva, que os textos literários provoquem diretamente comoções sociais ou acelerem as revoluções. Os efeitos sociopolíticos de um poema, de um drama ou de um romance não podem ser verificados porque não se mostram quase nunca de maneira coletiva, mas individual, e isso significa que variam enormemente de uma pessoa para outra. Por isso é difícil, para não dizer impossível, estabelecer normas precisas. Por outro lado, muitas vezes esses efeitos, quando resultam evidentes no âmbito coletivo, podem ter pouco a ver com a qualidade estética do texto que os produz. Por exemplo, um romance medíocre, A Cabana do Pai Tomás, de Harriet Beecher Stowe, parece ter desempenhado um papel importantíssimo na tomada de consciência social, nos Estados Unidos, dos horrores da escravidão; o fato de que esses efeitos sejam difíceis de identificar não significa que eles não existam, mas que se manifestam, de maneira indireta e múltipla, por meio dos comportamentos e ações dos cidadãos cuja personalidade os romances contribuíram para moldar.

A boa literatura, enquanto aplaca momentaneamente a insatisfação humana, incrementa-a e, fazendo que se desenvolva uma sensibilidade inconformista em relação à vida, torna os seres humanos mais aptos para a infelicidade. Viver insatisfeito, em luta contra a existência, significa empenhar-se, como dom Quixote, bater-se contra os moinhos de vento, condenar-se, de certa forma, a viver as batalhas travadas pelo coronel Aureliano Buendía, em Cem Anos de Solidão, sabendo que as perderia todas. Isso é provavelmente verdadeiro; mas também é verdadeiro que, sem a revolta contra a mediocridade e a sordidez da vida, nós, seres humanos, ainda viveríamos em condições primitivas, a história teria acabado, não teria nascido o indivíduo, a ciência e a tecnologia não se teriam desenvolvido, os direitos humanos não teriam sido reconhecidos, a liberdade não existiria, porque tudo isso nasceu de atos de insubmissão contra uma vida percebida como insuficiente e intolerável.

Tentemos traçar uma reconstrução histórica fantástica, imaginando um mundo sem literatura, uma humanidade que não haja lido romances. Nessa civilização ágrafa, com um léxico liliputiano, em que talvez os grunhidos e a gesticulação simiesca prevalecessem sobre as palavras, não existiriam certos adjetivos formados a partir das criações literárias: quixotesco, kafkiano, pantagruélico, rocambolesco, orwelliano, sádico e masoquista, entre muitos outros. Haveria loucos, vítimas de paranoias e delírios de perseguição, e pessoas de apetite descomunal e de excessos desmedidos, e bípedes que gozariam recebendo ou infligindo a dor, com certeza; mas não teríamos aprendido a ver por trás desses comportamentos extremados, em contraste com a pretensa normalidade, aspectos essenciais da condição humana, vale dizer, de nós mesmos, algo que só o talento criador de Cervantes, de Kafka, de Rabelais, de Sade ou de Sacher-Masoch nos revelou.

Quando veio a lume o Dom Quixote, os primeiros leitores riam daquele homem iludido e extravagante, da mesma forma como riam as outras personagens do romance. Agora sabemos que o empenho do Cavaleiro da Triste Figura em ver gigantes em vez de moinhos de vento e em cometer todos os desatinos que comete é a forma mais elevada de generosidade, um modo de protestar contra as misérias deste mundo e de procurar mudá-lo. Os próprios conceitos de ideal e de idealismo, tão impregnados de uma validade moral positiva, não seriam o que são - ou seja, valores claros e respeitáveis - se não tivessem encarnado naquela personagem de romance com a força persuasiva que lhe conferiu o gênio de Cervantes. E o mesmo se poderia dizer desse pequeno dom Quixote pragmático e de saias que foi Emma Bovary - o bovarismo não existiria, está claro -, que por sua vez se bateu com ardor para viver essa vida resplendente de paixões e de luxo que ela conhecera nos romances, e se queimou nesse fogo como a mariposa que se aproxima demais da chama.

Como as de Cervantes e Flaubert, as invenções dos grandes criadores literários, ao mesmo tempo em que nos arrancam de nossa prisão realista, conduzem e guiam pelos mundos da fantasia, abrem-nos os olhos sobre aspectos desconhecidos e secretos da nossa condição, e nos dão os instrumentos para explorar e entender mais os abismos do que é humano. Dizer "borgeano" significa destacar-se da realidade racional costumeira e penetrar numa fantástica, rigorosa e elegante construção mental, quase sempre labiríntica, impregnada de referências e alusões livrescas, cuja singularidade não nos é, todavia, estranha, porque nela reconhecemos desejos recônditos e verdades íntimas do nosso ser que só graças às criações literárias de um Jorge Luis Borges puderam tomar forma.

O adjetivo "kafkiano" nos vem à mente de maneira natural, como o flash de uma daquelas velhas máquinas fotográficas de fole, toda vez que nos sentimos ameaçados, como indivíduos inermes, por esses mecanismos opressores e destrutivos que tanta dor, tantos abusos e injustiças causaram no mundo moderno: os regimes autoritários, os partidos verticais, as igrejas intolerantes, as burocracias asfixiantes. Sem os contos e romances daquele atormentado judeu de Praga que escrevia em alemão e que viveu sempre à espreita, não teríamos sido capazes de compreender o sentido de fragilidade e impotência do indivíduo isolado ou das minorias discriminadas e perseguidas, ante as forças onipotentes que podem pulverizá-los.

O adjetivo "orwelliano", primo em primeiro grau de "kafkiano", refere-se à angústia opressiva e à sensação de absurdo extremo que geraram as ditaduras totalitárias do século xx, as mais refinadas, cruéis e absolutas da história, em seu controle dos atos, da psique e até dos sonhos dos membros de uma sociedade. Nos seus romances mais célebres, A Revolução dos Bichos e 1984, George Orwell descreveu, com acentos gélidos e de pesadelo, uma humanidade submetida ao controle do Grande Irmão, um senhor absoluto que, por meio de uma combinação eficaz de terror e tecnologia moderna, eliminou a liberdade, a espontaneidade e a igualdade - nesse mundo alguns são "mais iguais do que os outros" - e transformou a sociedade em uma colmeia de seres humanos autômatos, programados como os robôs. Não apenas as condutas obedecem aos desígnios do poder, mas também a língua, o newspeak, foi depurada de toda conotação individualista, de toda invenção ou matiz subjetivo, transformando-se numa enfiada de lugares-comuns e clichês impessoais, o que aumenta a servidão dos indivíduos ao sistema. É verdade que a profecia sinistra de 1984 não se materializou e que, como ocorreu com os totalitarismos fascista e nazista, o comunismo totalitário desapareceu na União Soviética e depois começou a se deteriorar na China e naqueles anacronismos que são ainda Cuba e a Coreia do Norte; mas a palavra "orwelliano" permanece como lembrança de uma das experiências político-sociais mais devastadoras vividas pela civilização, e que os romances e ensaios de George Orwell nos ajudaram a compreender nos seus mecanismos mais recônditos.

Por vezes, a imagem que se delineia no espelho que os romances e os poemas nos oferecem de nós mesmos é a imagem de um monstro. Ocorre quando lemos as horripilantes carnificinas sexuais fantasiadas pelo Divino Marquês, ou as tétricas dilacerações e sacrifícios que povoam os livros malditos de um Sacher-Masoch ou de um Bataille. E, todavia, o pior dessas páginas não são o sangue nem a humilhação, tampouco as torturas abjetas nem a sanha que as tornam febris; é a descoberta de que essa violência e os abusos não nos são estranhos, estão repletos de humanidade, de que esses monstros ávidos de transgressão e excesso estão entocados no mais fundo de nosso ser e que, das sombras onde estão ocultos, aguardam uma ocasião favorável para se manifestar, para impor a lei dos seus desejos, que acabaria com a racionalidade, com a convivência e talvez com a própria existência. Não a ciência, mas a literatura foi a primeira a examinar os abismos do fenômeno humano e a descobrir o apavorante potencial destrutivo e autodestrutivo que também o conforma. Portanto, um mundo sem romances seria parcialmente cego em face desses abismos terríveis onde com frequência jazem as motivações das condutas e comportamentos inusitados, e por isso mesmo tão injusto contra o que é diferente, como aquele que, em um passado não muito remoto, acreditava que canhotos, aleijados e gagos estivessem possuídos pelo demônio. Esse mundo talvez continuasse a praticar, como até há pouco tempo algumas tribos amazônicas, o perfeccionismo atroz de afogar nos rios os recém-nascidos com defeitos físicos.

Incivilizado, bárbaro, órfão de sensibilidade e pobre de palavra, ignorante e grave, alheio à paixão e ao erotismo, o mundo sem romances, esse pesadelo que procuro delinear, teria como traço principal o conformismo, a submissão dos seres humanos ao estabelecido. Seria um mundo animal. Os instintos básicos decidiriam a rotina de uma vida oprimida pela luta pela sobrevivência, pelo medo do desconhecido, pela satisfação das necessidades físicas, em que não haveria espaço para o espírito e a que, à monotonia sufocante da vida, acompanharia o pessimismo, a sensação de que a vida humana sempre será assim, e que nada nem ninguém poderá mudar o estado das coisas.

Quando se imagina um mundo assim, há a tendência a identificá-lo de imediato com o primitivo, com o trapo cobrindo os órgãos genitais, com as pequenas comunidades mágico-religiosas que vivem à margem da modernidade na América Latina, na Oceania e na África. A verdade é que o formidável desenvolvimento dos meios audiovisuais em nossa época - os quais, por um lado, revolucionaram as comunicações tornando todos os homens e mulheres do planeta partícipes da atualidade e, por outro, monopolizaram cada vez mais o tempo que os seres vivos dedicam ao ócio e à diversão em vez de à leitura - permite imaginar, como possível cenário histórico do futuro, uma sociedade moderníssima, repleta de computadores, telas e alto-falantes, e sem livros, ou mais precisamente, onde os livros - a literatura - se tornaram semelhantes à alquimia na era da física: uma curiosidade anacrônica, praticada nas catacumbas da civilização mediática por minorias neuróticas. Esse mundo cibernético, receio muito, apesar de sua prosperidade e poderio, de seus elevados níveis de vida e de suas façanhas científicas, seria profundamente incivilizado, letárgico, privado de espírito, uma humanidade resignada de robôs que abdicaram da liberdade.

É mais do que improvável que essa perspectiva sombria chegue a se concretizar. A história não está escrita, não há um destino preestabelecido que tenha decidido por nós o que seremos. Depende totalmente da nossa visão e da nossa vontade que aquela utopia macabra se realize ou se oculte. Se queremos evitar que com os romances desapareça, ou permaneça apartada no desvão das coisas inúteis, essa fonte que estimula a imaginação e a insatisfação, que nos aguça a sensibilidade e nos ensina a falar com força expressiva e rigor, e nos torna mais livres e nossas vidas mais ricas e intensas, é necessário agir. Há que ler os bons livros e incitar a ler, e ensinar a fazer isso a quantos venham depois de nós - nas famílias e nas aulas, nos meios de comunicação de massa e em todos os setores da vida comum - como uma ocupação imprescindível, pois que é a que imprime a sua marca em todos os demais, e os enriquece.

Fonte: Revista piauí - outubro de 2009

domingo, 25 de outubro de 2009

Selo recebido


Recebi este selinho da querida Claudia Bins, dona do excelente blog Mosaicos do Sul.

Regras do selinho:

Responder "qual é o hábito mais saudável que eu mantenho?"

Vamos lá! É o hábito de não contaminar o meu coração com sentimentos negativos.

Indicar 5 blogs:

Um Passo ao Céu

A Poética de Cibele Camargo

Lux Salus

Olhos Esmeraldas

Ao Pé do Cordeiro e do Leão

sábado, 24 de outubro de 2009

Passagens poéticas

lembra o tempo

que você sentia

e sentir

era a forma mais sábia

de saber

e você nem sabia?


Alice Ruiz



a vida

tatuou-me nos olhos

janelas

em que me transcrevo e apago



Mia Couto



Eu não dei por esta mudança,

tão simples, tão certa, tão fácil:

Em que espelho ficou perdida

a minha face?



Cecília Meireles


sexta-feira, 23 de outubro de 2009

RETRATO ANTIGO


Quem é essa

que me olha

de tão longe,

com olhos que foram meus?
.

Helena Kolody


segunda-feira, 12 de outubro de 2009

UMA BIBLIOTECA NAS MÃOS

Eu nunca imaginei que um dia seria possível transportar uma biblioteca dentro da bolsa. Este dia chegou!

O livro evoluiu e essa evolução começa a ser vendida aos brasileiros na próxima semana. É o Kindle, da Amazon, um leitor digital de textos que já vendeu mais de 1 milhão de unidades nos Estados Unidos.

O Kindle, cujo nome deriva dos verbos acender e iluminar em inglês, passará a ser vendido em 99 países, além do Brasil. Tecnicamente é um "e-reader", ou leitor eletrônico.

Em seu site, a Amazon.com revela que em menos de 60 segundos o conteúdo de livros, jornais, revistas e blogs do Kindle poderá ser acessado "esteja você em Paris, Bombaim ou São Paulo".
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A vantagem mais óbvia do Kindle em relação ao livro físico é sua possibilidade de armazenamento: num único produto de 289 gramas, 20 centímetros (cm) de altura e 13,5 cm de largura, é possível levar 1.500 publicações, entre livros, jornais e revistas.
.
Passa-se pelas páginas com o uso de botões que ficam na lateral do aparelho. É possível, ainda, marcar trechos e fazer anotações, através de um teclado embutido em sua parte inferior.

É ou não é uma aquisição genial?

Fonte: http://veja.abril.com.br/141009/brasil-rota-kindle-p-104.shtml

sábado, 10 de outubro de 2009

Sorteio do livro Budapeste

O blog Morena de Pintas, da minha amiga virtual Angela Dal Pos, está sorteando o livro Budapeste, do Chico Buarque. Você também pode concorrer!

Para fazer parte do sorteio, acesse o site http://angeladalpos.blogspot.com/ e deixe um comentário, mencionando a seguinte frase: "estou seguindo o blog por indicação da Angela, do Velejando nas Letras. "

Com isso, eu ganho mais uma participação no sorteio pela divulgação da promoção, e você estará automaticamente concorrendo. Desejo a todos boa sorte!
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Abaixo transcrevo a sinopse do livro:

"Ao concluir a autobiografia romanceada 'O ginógrafo', a pedido de um bizarro executivo alemão que fez carreira no Rio de Janeiro, José Costa, um ghost-writer de talento fora do comum, se vê diante de um impasse criativo e existencial. Escriba exímio, 'gênio', nas palavras do sócio, que o explora na 'agência cultural' que dividem em Copacabana, Costa, meio sem querer, de mera escrita sob encomenda passa a praticar 'alta literatura'. Também meio sem querer, vai parar em Budapeste, onde buscará a redenção no idioma húngaro, 'segundo as más línguas, a única língua que o diabo respeita'. Narrado em primeira pessoa, combinando alta densidade narrativa com um senso de humor muito particular, 'Budapeste' é a história de um homem exaurido por seu próprio talento, que se vê emparedado entre duas cidades, duas mulheres, dois livros, duas línguas e uma série de outros pares simétricos que conferem ao texto o caráter de espelhamento que permeia todo o romance."

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Rio 2016

O Rio começa a semana sob o efeito da vitória como cidade eleita para sediar as Olimpíadas de 2016. O otimismo toma conta dos cariocas e de todos que sonham com a cidade pacificada, justa e solidária.

Organizar a cidade para as Olimpíadas agora é prioridade, pois significa nada menos do que receber o mundo em nossa casa.

O povo carioca agradece!

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

UMA LENDA CHINESA

Era uma vez, uma jovem chamada Lin, que se casou e foi viver com o marido na casa da sogra.

Depois de algum tempo, começou a ver que não se adaptava à sogra.

Os temperamentos eram muito diferentes e Lin cada vez se irritava mais com os hábitos e costumes da sogra, que criticava cada vez com mais insistência.

Com o passar dos meses, as coisas foram piorando, a ponto da vida se tornar insuportável. No entanto, segundo as tradições antigas da China, a nora tem que estar sempre a serviço da sogra e obedecer-lhe em tudo.

Mas Lin, não suportando por mais tempo a ideia de viver com a sogra, tomou a decisão de ir consultar um Mestre, velho amigo do seu pai.

Depois de ouvir a jovem, o Mestre Huang pegou num ramalhete de ervas medicinais e disse-lhe: "Para te livrares da tua sogra, não as deves usar de uma só vez, pois isso poderia causar suspeitas. Vais misturá-las com a comida, pouco a pouco, dia após dia, e assim ela vai-se envenenando lentamente. Mas, para teres a certeza de que, quando ela morrer, ninguém suspeitará de ti, deverás ter muito cuidado em tratá-la sempre com muita amizade. Não discutas e ajuda-a a resolver os seus problemas."

Lin respondeu: "Obrigado, Mestre Huang, farei tudo o que me recomenda".

Lin ficou muito contente e voltou entusiasmada com o projeto de assassinar a sogra.

Durante várias semanas, Lin serviu, dia sim dia não, uma refeição preparada especialmente para a sogra. E tinha sempre presente a recomendação de Mestre Huang para evitar suspeitas: controlava o temperamento, obedecia a sogra em tudo e tratava-a como se fosse a sua própria mãe.

Passados seis meses, toda a família estava mudada. Lin controlava bem o seu temperamento e quase nunca se aborrecia. Durante estes meses, não teve uma única discussão com a sogra, que também se mostrava muito mais amável e mais fácil de tratar com ela. As atitudes da sogra também mudaram e ambas passaram a tratar-se como mãe e filha.

Certo dia, Lin foi procurar o Mestre Huang, para lhe pedir ajuda e disse-lhe: "Mestre, por favor, ajude-me a evitar que o veneno venha a matar a minha sogra. É que ela transformou-se numa mulher agradável e gosto dela como se fosse a minha mãe. Não quero que ela morra por causa do veneno que lhe dou."

Mestre Huang sorriu e abanou a cabeça: "Lin, não te preocupes. A tua sogra não mudou. Quem mudou foste tu. As ervas, que te dei, são vitaminas para melhorar a saúde. O veneno estava nas suas atitudes, mas foi sendo substituído pelo amor e carinho que lhe começaste a dedicar. "

Na China, há um provérbio que diz:

"A pessoa que ama os outros também será amada".

Os árabes têm outro que diz:

"O nosso inimigo não é aquele que nos odeia, mas aquele que nós odiamos."

Fotos retiradas do arquivo de imagens do google

sábado, 19 de setembro de 2009

O DOIDO DA GARRAFA

Ele não era mais doido do que as outras pessoas do mundo, mas as outras pessoas do mundo insistiam em dizer que ele era doido.

Depois que se apaixonou por uma garrafa de plástico de se carregar na bicicleta e passou a andar sempre com ela pendurada na cintura, virou o Doido da Garrafa.

O Doido da Garrafa fazia passarinhos de papel como ninguém, mas era especialista mesmo em construir barquinhos com palitos. Batizava cada barco com um nome de mulher e, enquanto estava trabalhando nele, morria de amores pela dona imaginária do nome. Depois ia esquecendo uma por uma, todas elas, com exceção de Olívia, uma nau antiga que levou dezessete dias para ser construída.

Batucava muito bem e vivia inventando, de improviso, músicas especialmente compostas para toda e qualquer finalidade, nos mais variados gêneros. Vai aí aquela da mulher de blusa verde atravessando a rua apressada, e o Doido da Garrafa imediatamente compunha um samba, uma valsa, um rock, um rap, um blues, dependendo da mulher de blusa verde, do atravessando, da rua e do apressada. Geralmente ficava uma obra-prima.

Gostava muito de observar as pessoas na rua, do cheiro de café, de cantar e de ouvir música. Não gostava muito do fato de ter pernas, mas acabou se acostumando com elas. De cabelo ele gostava. Em compensação, tinha verdadeiro horror a multidão, bermudão, tubarão, ladrão, camburão, bajulação, afetação, dança de salão, falta de educação e à palavra bife.

Escrevia cartas para ninguém, umas em prosa, outras em poesia, como mero exercício de estilo.

Tinha mania de dar entrevistas para o vento e já sabia a resposta de qualquer pergunta que porventura alguém pudesse lhe fazer um dia.

Ajudava o dicionário a explicar as coisas inventando palavras necessárias, como dorinfinita.

Adorava álgebra, mas tinha particular antipatia por trigonometria, pois não encontrava nenhum motivo para se pegar pedaços de triângulos e fazer contas tão difíceis com eles.

Conhecia mitologia a fundo.

Tinha angústia matinal, uma depressão no meio da tarde que ele chamava de cinco horas, porque era a hora que ela aparecia, e uma insônia crônica a quem chamava carinhosamente de Proserpina.

Sentia uma paixão azul dentro do peito, desde criança, sempre que olhava o mar e orgulhava-se muito disso.

Acreditava no amor, mas tinha vergonha da frase.

Às vezes falava sozinho, Preferia tristeza à agonia.

Todas as noites, entre oito e dez e meia, era visto andando de um lado para o outro da rua, método que tinha inventado para acabar de vez com a preocupação de fazer a volta de repente, quando achava que já tinha andado o suficiente. (Preferia que ninguém percebesse que ele não tinha para onde ir.) Enquanto andava, repetia dentro da cabeça incessantemente a palavra ecumênico sem ter a menor idéia da razão pela qual fazia isso.

Durante o dia o Doido da Garrafa trabalhava numa multinacional, era sujeito bem visto, supervisor de departamento, ganhava um bom salário e gratificações que entregava para a mulher aplicar em fundos de investimento.

No fim do ano ia trocar de carro.

Era excelente chefe de família.

Não era mais doido do que as outras pessoas do mundo, mas sempre que ele passava as outras pessoas do mundo pensavam, lá vai o Doido da Garrafa, e assim se esqueciam das suas próprias garrafas um pouquinho.

Adriana Falcão

Fonte: Conto extraído do livro O Doido da Garrafa, de Adriana Falcão
[Imagem: Getty Image]

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Tiradentes/MG

Hoje eu vou falar de Tiradentes, esse encanto de cidade que eu recomendo e não canso de visitar.Durante o dia ou à noite, caminhar pelas ruas da cidade é uma delícia. Não apenas pela beleza arquitetônica dos casarios coloniais, mas também pelo charmoso comércio que se estende ao longo das ruas principais.Com uma boa garimpagem encontram-se aquelas pequenas sutilezas indispensáveis para vestir com bom gosto e graça qualquer casa. E mais ainda, as opções de antiquários, galerias de arte, museus, igrejas, restaurantes e inumeráveis outras lojas, que expõem objetos de cerâmica, madeira e artesanatos típicos da região. Falar de Tiradentes e não mencionar a cozinha mineira é cometer uma enorme heresia. Além da excelente comida caseira da Nazaré, dona da casa que alugo toda vez que visito a cidade, gosto do restaurante da Beth e tenho um carinho especial pelo simpaticíssimo restaurante Ora Pro Nobis, da Áurea, onde eu passei um reveillon em companhia da minha mãe, irmãos, minha filha mais nova e sobrinhos. Fica aqui a minha dica. Tiradentes merece ser visitada, porque é sinônimo de cultura, tradição e garantia de muito bom gosto!

Um pouco da história de Tiradentes:

Formada em início do século XVIII, a cidade de Tiradentes originou-se do pequeno arraial da Ponta do Morro. Graças à abundância do ouro encontrado, o arraial desenvolveu-se rapidamente, sendo elevado à categoria de vila em 1718, quando recebeu a denominação de São José del-Rei.
Nas primeiras décadas do século XVIII, foi construída a maior parte de seu casario e de suas edificações religiosas, como a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em 1708, e a Matriz de Santo Antônio, em 1710. Ao redor das igrejas e capelas, localizadas em pontos elevados da cidade, as casas foram se firmando numa configuração que permanece até hoje.

Em 1889 passou a chamar-se Tiradentes, em homenagem ao herói da Inconfidência Mineira, Joaquim José da Silva Xavier. Hoje, uma das importantes fontes de renda da cidade é o turismo. A cidade foi tombada como Patrimônio Histórico Nacional em 1938 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - Iphan, resguardando-se não só seu conjunto arquitetônico como também áreas de seu entorno paisagístico, especialmente a imponente Serra de São José com agradáveis cachoeiras e vegetação remanescente da Mata Atlântica.